Até a perda da maioria absoluta polo espanholíssimo Partido Socialista no concelho da Corunha, os governos encabeçados primeiro por Francisco Vasques e depois por Javier Losada (provavelmente Lousada, a nom ser que poda apresentar razons biológicas para a sua condiçom de renegado) tinham claro como se normaliza um idioma: pola via da imposiçom. E agírom em conseqüência.
É assim como se vem impondo, indefectivelmente, o espanhol no nosso país, desde há bastantes séculos, em funçom das possibilidades objectivas que para tal foi tendo a Administraçom espanhola num território durante muito tempo rural, mal comunicado e alheio aos efeitos de umha inexistente escolarizaçom em massa e de uns limitados meios de comunicaçom. De facto, à medida que as comunicaçons, o ensino e os mass media fôrom estendendo-se ao conjunto do nosso povo, a política lingüística oficial tem dado resultados mais claros e rápidos, pois os mecanismos de fundo –o controlo da economia, as vias de promoçom social, o submetimento político-institucional, o poder simbólico– tenhem funcionado optimamente a favor do espanhol nos últimos séculos.
Entender isso –que os idiomas se normalizam pola via da imposiçom– é fundamental para quem quiger fazê-lo. Vasques e Losada sabem-no e, além do mais, contavam até há pouco com o apoio institucional e eleitoral necessário para agirem em conseqüência. Nem sequer necessitavam aparentar qualquer simpatia ou cumplicidade para com os corunheses e corunhesas que falam aquilo que o Estatuto de Autonomia define como língua própria da Galiza.
Porém, nas últimas eleiçons municipais, os resultados alterárom a correlaçom de forças e o PSOE decidiu pactuar com o BNG um governo de coligaçom que lhe permitisse manter a maior quota de poder no pleno e no governo locais.
Como tem afectado isso à possível normalizaçom das duas línguas oficiais nesse concelho?
O sintoma mais claro de mudança é a recente apresentaçom de umha proposta de Ordenança Municipal de Normalizaçom Lingüística, por parte do BNG. Umha Ordenança que, caso seja aprovada, chegará com umha década de atraso em relaçom a outros concelhos galegos próximos, como o de Ferrol.
Claro que, para que isso aconteça, Losada e o resto do PSOE corunhês terám que ter garantias, afirmárom, de que nom haverá “imposiçons”. A partir daí, poderá activar-se um reajustamento nas condiçons de imposiçom do espanhol na Corunha, passando a instituiçom municipal a “aparentar qualquer simpatia ou cumplicidade para com os corunheses e corunhesas que falam aquilo que o Estatuto de Autonomia define como língua própria da Galiza”.
Assim será, no melhor dos supostos
Lembremos que Ferrol aprovou a sua flamante Ordenança em 1997 e, apesar de terem passado polos sucessivos governos forças tam variadas como o PP, o PSOE, o BNG, IU e IF, a Ordenança aprovada há umha década nunca foi levada à prática. Na actual legislatura, Vicente Irisarri e muitos dos seus colegas continuam a falar espanhol, em público e em privado, como fai a maior parte dos funcionários públicos dessa instituiçom municipal.
Nom é a nossa intençom desprezar a proposta do BNG. Aplaudiremos a aprovaçom de umha nova Ordenança Municipal de Normalizaçom Língüística, mais umha, e que o galego entre assim, nem que seja só nos dias de festa, nas ilustres instalaçons de Maria Pita. Reconheceremos a meritória iniciativa do Bloque.
No entanto, manteremos a nossa firme e realista convicçom de que, sem imposiçons, nom há normalizaçom, a nom ser que entendamos por ‘normalizaçom’ o que é só umha relativa galeguizaçom da vida administrativa nas instituiçons públicas da Galiza autonómica. De facto, é isso que interpretam as principais forças institucionais, como nos demonstrou a própria representante corunhesa do BNG quando defendeu a sua proposta de Ordenança: “Nom se vai impor o galego a ninguém, trata-se apenas de normalizar um idioma como se fai noutros concelhos da Galiza. Nom há nada de novo, está todo inventado”.
Com efeito, está todo inventado. Essas palavras da vereadora do Bloque, reproduzidas nos meios de comunicaçom, sintetizam as graves carências das políticas institucionais frente às necessidades da nossa comunicade lingüística. Necessitamos umha normalizaçom real, e temos umha virtual. Precisamos de umha normalizaçom como a que já está a ser aplicada ao espanhol nas nossas universidades, nas instituiçons municipais, nos tribunais, nas empresas, na sanidade, nas salas de cinema, nos estádios de futebol, nos jornais e nos restantes meios de comunicaçom, públicos e privados. Está todo tam inventado que só necessitamos a normalizaçom aplicada ao espanhol em qualquer território de populaçom espanholfalante, como Santander, Valhadolid, Sevilha ou Albacete.
Necessitamos, em definitivo, umha normalizaçom territorializada: um só idioma com todas as funçons sociais para o conjunto de um território, o nosso, e a liberdade para as pessoas falarem e até serem individualmente atendidas noutros idiomas quaisquer, mesmo incluindo como preferencial o espanhol. Nada que inventar, pois é a normalizaçom que já conquistárom o flamengo na Flandres e o francês no Quebeque ao longo do século XX; a normalizaçom que os espanhóis também reclamam para Porto Rico perante o domínio do inglês; a que a Confederaçom Helvética reconhece a cada um dos cantons que formam a Suíça, de maneira imperceptivelmente impositiva, pois ninguém é individualmente consultado ao nascer sobre o idioma em que vai desenvolver o resto da sua vida.
Essa é a única normalizaçom possível. Umha normalizaçom que, no nosso caso, só poderá vir fruto de umha escolha consciente da maioria do nosso povo, que exija aos seus representantes políticos –a ser possível, num modelo de intervençom social bem mais democrático que o actual– a imposiçom, sim, do galego como língua nacional. Renunciarmos a umha normalizaçom real supom que nos conformamos com a pobre subsistência de umha versom traduzida e redundante do único idioma que conta, até o nosso definitivo esmorecimento como povo. E essa é a única leitura possível das políticas lingüísticas que nos últimos vinte e cinco anos tenhem sido aplicadas polas principais forças institucionais actuantes na Galiza.
Mas, para alguns galegos, nom sei se poucos ou muitos –porque nunca fomos consultados sobre essa questom– já chega de pantomimas. Agradeceríamos algumha sinceridade quanto a quem quer atingir objectivos normalizadores sérios e, a partir daí sim, acharíamos adissível que se estudassem os ritmos e os caminhos para avançarmos numha imposiçom colectiva que garanta um direito tam democrático e irrenunciável como é a existência digna da nossa comunicade lingüística.
Maurício Castro naceu en Ferrol en 1970. É profesor de portugués, actualmente adscrito á Escola Oficial de Idiomas da Coruña, despois de dous anos de docencia en Badaxoz. »