Os seres humanos, animais sociais, mostramos nosso crescimento principalmente em duas dimensões; uma física, e outra que podemos denominar mental ou psicológica. A física é evidente porque é visível; porem a psicológica é mais difícil de perceber e portanto os abusos nesta área são também mais difíceis de perceber e mesurar.
Um tipo de abuso que todos e todas na nossa sociedade repudiamos, e mesmo denunciamos e castigamos socialmente, é o abuso sexual na infância. Inclusive quando observamos práticas sexuais de adultos com crianças em culturas onde isto está socialmente admitido como uma prática normal, a nós nos causa a mesma repugnância e enjoo.
Quando se trata de abuso sexual todos e todas nós somos capazes de o ver com toda claridade; porque compreendemos que nessas circunstâncias não se está a ter em conta a sexualidade da criança, que só está ao serviço das necessidades sexuais do adulto. Bom, pois apesar dessa nossa habilidade para detectar este tipo de abuso físico, seguimos a ser incapazes de detectar a grande maioria de situações de abuso psicológico.
Um território no que eu diria se cometem mais este tipo de abusos mentais é o religioso. Onde as crianças são sometidas a práticas e rituais que, embora possam ser entendidos pola mente do adulto, apesar da falta de racionalidade das mesmas, são totalmente inadequadas para a mente infantil. Estas práticas estão exclusivamente ao serviço das necessidades do adulto e portanto quando se somete a elas às crianças devemos considerá-las abuso.
E um pode chegar a aceitar que cada pai e cada mãe na sua casa, e na sua paroquia, possam ter a liberdade de someter a seus filhos e filhas a essas práticas para satisfação espiritual deles, adultos; ora bem, o que não é aceitável baixo nenhum conceito é que essas práticas se levem a cabo polas instituições governamentais; o endoutrinamento das crianças na escola, não só é um atentado contra as liberdades dos pequenos, é abuso psicológico, e o mais trágico é que é facilitado polas leis do Estado Espanhol, precisamente o órgão que o devia evitar; e o que é ainda mais grave, esse lavado de cérebro dos miúdos e miúdas na actualidade se permite polos motivos equivocados: o custe político para o partido no governo.
Richard Dawkins no seu livro “The God Delusion”, recolhe entre outras testemunhas a de uma mulher americana de uns quarenta anos que fora educada na fé católica. Esta mulher sofrera abuso sexual quando tinha sete anos a mãos do padre da sua paroquia no carro dele. Por aquela mesma época a ela morrera-lhe um amigo e companheiro de escola, que era protestante; a ela lhe fora dito que ele iria ao inferno. De adulta ela conta que o que a ela lhe aconteceu foram duas formas de abuso, um físico e o outro mental, e que o segundo era muito pior...
“Ser tocada polo padre me deixava só uma sensação de asco, de nojo, mentes que a imagem do meu amigo indo ao inferno produzia-me um frio e um medo incomensurável. Eu nunca perdi o sono por lembrar os tocamentos, ora passei noites aterrorizada pensando que gente que eu amava ia para o inferno, deu-me muitos pesadelos.”
A modo de conclusão podemos dizer que, para além de a religião transmitir valores machistas e crenças absurdas, quando estás ideias são impostas a crianças indefensas e portanto mentalmente vulneráveis, isto é constitutivo de abuso. Se o adulto quer abraçar um deus macho de barbas brancas que através de um espirito (fantasma) deixou a uma mulher, que estava casada com um honrado trabalhador, grávida... e que de esse caso nasceu um meninho que era à vez seu filho e ele próprio... que depois esse filho, que era à vez seu próprio pai, fundou uma seita que tem como representante ao papa de Roma, que tem que ser um homem escolhido por homens... bom, enfim se o adulto quer acreditar nisso pois avante, ora os meninhos e meninhas deviam ser respeitados a ter idade para distinguir entre o que é racional e o que é irracional e só depois escolher...
Imaginemos que isso que se faz com as ideologias religiosas se fizesse com as ideologias políticas, e isso que para a democracia as ideologias políticas são imprescindíveis, quanto que as religiosas são desnecessárias e irrelevantes (ou até contrarias ao espírito democrático de igualdade). Imaginemos que as crianças fossem obrigadas a militar num partido político, fossem obrigadas a ir a reuniões e a votar o que escolhessem seus pais e mães; e por se isso não fosse suficiente, imaginem que nas escolas se dessem aulas dessa ideologia... isso teria um nome, não teria?
Pois bom, deixar que se dêem aulas de uma ideologia religiosa que defende a desigualdade entre homens e mulheres e que promove a superioridade do varão sobre a mulher é, para além de imoral, promover o abuso psicológico, e, a meu modo de ver, vai contra a democracia e a constituição. Admitir este tipo de abuso levado a cabo pola Igreja, e facilitado polo Estado, como algo normal e como admitir que uma mulher pode parir e continuar a ser virgem, ou que deus pode ser uno e trino, ou admitir como figura geométrica “o circulo quadrado existente”.
Concha Rousia nasceu em 1962 em Covas, uma pequena aldeia no sul da Galiza. É psicoterapeuta na comarca de Compostela. No 2004 ganhou o Prémio de Narrativa do Concelho de Marim. Tem publicado poemas e relatos em diversas revistas galegas como Agália ou A Folha da Fouce. Fez parte da equipa fundadora da revista cultural "A Regueifa". Colabora em diversos jornais galegos. O seu primeiro romance As sete fontes, foi publicado em formato e-book pola editora digital portuguesa ArcosOnline. Recentemente, em 2006, ganhou o Certame Literário Feminista do Condado. »